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segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Lava-Jato fechou 2017 com R$ 15 bilhões em multas a empresas e pessoas envolvidas em desvios

O GLOBO

De forma silenciosa, a Operação Lava-Jato está conduzindo à integração segmentos da burocracia que antes se mostravam reticentes à colaboração mútua, como Receita Federal, Ministério Público, Polícia Federal, Banco Central e Conselho de Controle das Atividades Financeiras (Coaf). Resistências corporativas persistem — há situações em que até recrudesceram, como ocorre entre a Polícia Federal e o Ministério Público, envolvidos em controvérsias nos últimos tempos. No conjunto, porém, os avanços são perceptíveis.

O lado mais visível — e público — dessa cooperação está nos tribunais federais, onde já foram confirmados 284 acordos de delação premiada e duas dezenas de pactos de leniência empresarial, mecanismo para pessoas jurídicas confessarem seus esquemas de corrupção. Até dezembro passado, contavam-se 165 condenações em juízos de primeira instância pelo Brasil. Ainda existem 273 inquéritos pendentes de decisão no Supremo Tribunal Federal (STF).

Os resultados, no entanto, vão muito além das sentenças judiciais. A Receita, por exemplo, intensificou investigações que redundaram em crescimento expressivo da cobrança de débitos tributários de empresas e pessoas envolvidas na Lava-Jato. Terminou 2017 com R$ 15 bilhões em multas, na estimativa preliminar. Isso representa um aumento de 226% em comparação às autuações feitas em 2014, e de 41% em relação aos débitos acumulados até o fim de 2016.

Processos fiscais contra cerca de 800 empresas avançaram a partir da criação de um banco de dados da Receita, do Coaf e do Banco Central. Em março de 2014, quando ocorreram as primeiras prisões na Lava-Jato, existia um arquivo de cem mil páginas de documentos extraídos de 94 processos judicais e de comunicações de operações financeiras suspeitas.

ACERVO DIGITAL

A operação manual do arquivo se tornou inviável no ritmo das investigações da Polícia Federal e do Ministério Público. No ano seguinte, montou-se um banco de dados com acesso remoto e capacidade para cruzamentos de informações em grande volume — no início dos inquéritos na Caixa Econômica Federal, por exemplo, analisaram-se contas bancárias de quase uma centena de empresas.

Agora, o SisLava, como é conhecido, guarda mais de quatro milhões de páginas, o equivalente a 40% do acervo digital da Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro. Ele armazena nomes de 58 mil pessoas físicas e empresas que, em algum momento, pontuaram na Lava-Jato. Registra quem carregou a mala ou a mochila de dinheiro, quem recebeu, quem são os operadores das contas e empresas usadas para lavagem de ativos no exterior e até quem comprou um carro com pagamento parcelado — como foi o caso do doleiro Alberto Youssef, que presenteou, em maio de 2013, o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, com um utilitário Land Rover no valor de R$ 250 mil.

Esse volume de informações foi decisivo para induzir à colaboração intermediários como Youssef, executivos de empresas estatais como Costa e empresas privadas como Odebrecht e Andrade Gutierrez. Eles optaram pela negociação da pena, confessaram e delataram parceiros de corrupção e políticos beneficiários, como o ex-presidente Lula, o ex-governador Sérgio Cabral, o senador Aécio Neves e o ex-deputado federal Eduardo Cunha.

A cooperação levou o Coaf a recordes na coleta e análise de informações. Ano passado, aumentou em 170% a produção de Relatórios de Inteligência Financeira. Antes da Lava-Jato, o conselho produzia 2.450 análises por ano. Em 2017, somou 6.611 relatórios, o dobro da marca alcançada há três anos.

De cada dez comunicações empresariais recebidas no Coaf, sete se referem a transações obscuras realizadas com dinheiro vivo. São Paulo é o estado líder em operações suspeitas — foram 3,5 milhões em 2017, contra 2,3 milhões no ano anterior. O Rio vem logo em seguida no ranking, contabilizando 740 mil negociações atípicas com dinheiro em espécie. Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraná completam o ranking dos cinco mais. Todos os relatos foram feitos em segredo por mais de 1.800 instituições financeiras, além de empresas de contabilidade, bolsas de valores, juntas comerciais, fundos de pensão, loterias, imobiliárias, joalheiras e galerias de arte.

COOPERAÇÃO INTERNACIONAL

Outro efeito da Lava-Jato é a abertura do Brasil à cooperação internacional. Em dezembro, o Ministério Público Federal somava 201 pedidos específicos a 41 países. Em contrapartida, recebeu outros 179 de 31 governos.

Agora, intensifica-se a assistência mútua com o exterior na área fiscal. A partir deste mês acaba o sigilo bancário do Brasil com 113 países. O intercâmbio automático havia começado em 2015 com os Estados Unidos, onde 4.700 brasileiros mantêm imóveis em nome de empresas.

A Receita vai ter acesso aos dados de todas as pessoas e empresas brasileiras com ativos no exterior, estimados em R$ 308 bilhões e na maior parte concentrados em uma dúzia de países. Em troca, até junho, 113 governos ganham conexão automática às informações sobre negócios e contas de pessoas e empresas estrangeiras no Brasil.

Esconder patrimônio no exterior vai ficar mais difícil, mas não impossível. Sobram alternativas em países como Venezuela, Iraque, Síria, Sudão e Guiné Equatorial. Investir neles é fácil. Difícil é recuperar o dinheiro.

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