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quarta-feira, 3 de setembro de 2014

EXEMPLO DE VIDA Zagueiro da Seleção sub-21 coloca a avó que catava latas na rua para morar em hotel de luxo em Mônaco

Hoje no Monaco, zagueiro Wallace lembra esforço da avó: "Catava latinha"

Convocado por Gallo para Seleção sub-21, ex-cruzeirense vive nova realidade na Europa e não esquece dedicação de dona Maurília quando pensou em parar de jogar

Wallace Fortuna dos Santos bem que poderia nunca ter encontrado a sua fortuna. Jogava na base do Tigres, do Rio de Janeiro, desde os nove anos, mas sem dinheiro, a família penava para sustentá-lo. Quando todos ficaram desempregados, Wallace decidiu que largaria o futebol. Queria encontrar um emprego para ajudar em casa. Mas a avó Maurília, hoje com 62 anos, o impediu: "Não meu filho, falam que você tem talento, por isso vamos persistir. Vamos meu filho", foram as palavras de vó, que Wallace recorda como se fossem hoje. 

- Ela catava latinha, catava garrafa na rua, tudo, só para me dar algum dinheiro para eu ir treinar. Hoje, graças a Deus, catar latinha não é mais para a gente - recorda o zagueiro.

Aos 19 anos, Wallace acaba de ser emprestado pelo Braga ao Monaco e faz parte da Seleção sub-21 que o técnico Alexandre Gallo começa a preparar para as Olimpíadas de 2016, no Rio de Janeiro. Agora, dona Maurília está morando em um hotel luxuoso de Montecarlo, com Wallace e a namorada. O pai, a mãe e o filho do jogador ficaram no Brasil, mas o atleta espera levar a família toda para Mônaco caso seja contratado em definitivo pelo clube no final da temporada.

Wallace posa em uma marina em Montecarlo: realidade diferente da que viveu no Rio de Janeiro (Foto: Claudia Garcia)

Graças à ajuda da avó, o zagueiro conseguiu se firmar como jogador de futebol. Foi levado para o Cruzeiro em 2010, estreou no time principal no ano passado e foi campeão brasileiro. Pela base do Brasil, já conquistou duas vezes o Torneio de Toulon com Gallo. Um dia, Wallace recebeu uma ligação de um dos empresários mais poderosos do futebol mundial: Jorge Mendes. Era a chance de realizar o sonho de Maurília.

- A primeira vez que falei com ele foi por telefone, fiquei até em dúvida se era ele ou não. Depois nos encontramos já em Braga, nos apresentamos e ficou tudo certinho. Eu fiquei muito surpreso quando ele me ligou se identificando como sendo o Jorge Mendes. Pensei logo que, como ele trabalha com grandes jogadores, era bom para mim, foi um reconhecimento do meu trabalho.

A Gestifute de Jorge Mendes (empresário de Cristiano Ronaldo, Dí Maria, James Rodriguez, Falcão, José Mourinho, entre tantos outros) comprou 60% do passe de Wallace ao Cruzeiro por 9,5 milhões de euros (cerca de R$ 30 milhões) e o zagueiro assinou com o Braga, de Portugal, clube onde Mendes tem forte influência. Mas, menos de dois meses depois, o empresário, que também tem grande poder no Monaco, da França, negociou o empréstimo de Wallace por uma temporada ao clube do principado, treinado pelo português Leonardo Jardim, que também é cliente de Mendes. Um negócio que parece, para já, agradar a todos e principalmente a Wallace que, com apenas 19 anos, vai estrear no Campeonato Francês e na Liga dos Campeões.

GLOBOESPORTE.COM: Wallace, você saiu do Cruzeiro para o Braga por 9,5 milhões de euros (cerca de R$ 30 milhões) e dois meses depois assinou com o Monaco. Como é que aconteceu essa negociação tão rápida?

WALLACE: Nem eu sei explicar como aconteceu. Tudo começou no Cruzeiro. Graças a Deus, estava jogando bem no Cruzeiro e houve interesse do Braga. Mas não cheguei nem a estrear no Braga, fiz só alguns amistosos. Aí, me disseram que o AS Monaco estava interessado em um zagueiro e que eu encaixaria bem nesse perfil. Vim por empréstimo de um ano e espero ser comprado pelo Monaco no final desta temporada.

Wallace em ação pelo Cruzeiro: nas graças de Jorge Mendes (Foto: Dorival Rosa/VIPCOMM)

O responsável por tudo isto foi Jorge Mendes. Quando foi o primeiro contato com ele?

A primeira vez que falamos foi por telefone, fiquei até em dúvida se era ele ou não. Depois nos encontramos já diretamente em Braga. Nos apresentamos e ficou tudo certinho. Eu fiquei muito surpreso quando ele me ligou se identificando como sendo o Jorge Mendes. Pensei logo que, como ele trabalha com grandes jogadores, era bom para mim, foi um reconhecimento do meu trabalho. 

Mas você tem ideia de quando que ele começou a observar o seu trabalho?

Jorge me disse que já vinha me acompanhando desde as seleções de base do Brasil. Já disputei alguns torneios, ganhei duas vezes o Torneio de Toulon e sempre que entrava no time principal do Cruzeiro eu atuava bem. Isso gerou o interesse não só da Gestifute, mas também de outros times. 




Que clubes?

Não sei identificar, mas assim nos bastidores o que eu ouvia dizer é que havia interesse de grandes times em mim.

E o que é que o Jorge Mendes prometeu a você? Ele sempre dá muitas garantias aos jogadores.

Ele disse para eu me preocupar em jogar o meu futebol, porque fora de campo ele resolvia tudo. E eu sei que estando bem e, com a força que ele tem fora de campo, com certeza vai dar tudo certo. 

Quais são os seus planos aqui no Monaco?

Sei que a equipe já está montada. Vou continuar trabalhando no dia a dia para estar preparado na hora certa. Essa hora vai chegar e eu vou estar pronto. Espero estrear também na Liga dos Campeões. 

Você foi campeão brasileiro com o Cruzeiro ano passado. Agora, o time lidera de novo o campeonato. Como é que possível se manter tanto tempo no topo?

É bem difícil, porque o Brasileirão é um campeonato muito competitivo, até os times menores dão grande trabalho para as grandes equipes. O Cruzeiro vem se mantendo no topo graças a um grande trabalho coletivo. O time manteve os grandes jogadores e o grupo é unido. Isso faz diferença. Ali todos trabalham com o mesmo objetivo que é estar bem para vencer grandes títulos.

Zagueiro exibe a tatuagem com nome do filho Heitor, que ficou no Brasil (Foto: Claudia Garcia)

Até chegar ao Cruzeiro em 2010, como é que foi o seu percurso no futebol?

Foi bem complicado. Comecei na base do Tigres do Brasil, da segunda divisão do Rio. Cheguei lá em 2004 e fiquei até 2010. O Tigres é um time pequeno, mas tem uma estrutura muito grande, trabalhei com grandes profissionais. Primeiro fiz trabalho de futsal e depois fui me adaptando ao campo. Consegui algum destaque na base em pequenos torneios até ser observado por olheiros do Cruzeiro que me levaram para lá ainda nas categorias de base. 

Que dificuldades você passou até chegar ao Cruzeiro?

Passei muitas dificuldades de grana mesmo. Nem sempre tinha dinheiro para pagar a passagem de ônibus para o treino e às vezes tinha mesmo de faltar. Acho que todo o mundo entendia o motivo e por isso relevavam a minha ausência. Fui levando desse jeito, às vezes dava para ir eu ia, outras vezes não ia. Pensei em largar tudo e procurar um trabalho para ganhar alguma grana. 

Mas não fez isso?

Não, graças à minha avó Maurília. Ela é que é a grande responsável por eu estar aqui. Minha avó é tudo na minha vida. Quando eu falei para ela que ia desistir do futebol, ela disse: “Não meu filho, não vai não. Falam que você tem talento, vamos persistir.” Foi a força dela que me motivou e me ajudou nesses momentos difíceis. 

Era sua avó quem te dava o dinheiro?

Wallace exibe as camisas do Cruzeiro e da Seleção: história na base (Foto: Fred Gomes)

Ela era governanta e tinha uma condição mais ou menos. Mas houve um momento em que todo o mundo da minha família estava desempregado. Ela segurou a minha mão e disse "vamos meu filho". Ela não tinha dinheiro e ia catar latinha, catava garrafa, tudo, só para me dar o dinheiro para eu ir para o treino. Graças a deus, catar latinha não é mais para a gente agora.

E como é que você se sente vivendo aqui nessa cidade luxuosa, observando toda esta ostentação, depois de ter passado por essas dificuldades?


É estranho. Tem hora que eu paro e fico pensando que até há alguns anos eu não conhecia esse mar azulzinho, nunca tinha visto esses barcos grandes e iates, nunca pensei estar aqui. Sempre tive aquele sonho pequeno de estar jogar em um grande clube do Brasil, mas estar aqui, é tudo diferente para mim. Só tenho de agradecer a Deus e a minha avó por isso.

Além de você estar em um grande clube europeu e perto de estrear na Liga dos Campeões, você também é escolha recorrente de Alexandre Gallo para a Seleção sub-21.

É verdade. Estou construindo uma história na seleção brasileira. Cheguei em 2013, já conquistei duas vezes o Torneio de Toulon. Em 2013 como titular, nesta edição fui reserva, porque a dupla da zaga foi Dória e Marquinhos, mas eu tenho ido bem, tenho recebido bastante elogios e espero me firmar como titular da seleção brasileira.

E como é trabalhar com o Gallo. Ele é diferente dos outros técnicos que você teve no Brasil?

Ele é um treinador muito inteligente, gosta muito de trabalhar taticamente e passa muita confiança para os jogadores. Acho que é um profissional honesto, gosta da verdade acima de tudo e trabalha muito em cima do dia a dia. Eu me sinto bem na Seleção, desde que ele chegou, estamos trabalhando duro e só estamos vencendo torneios. Acho que é sim um trabalho bem diferente.

Você já sonha com a Copa do Mundo da Rússia?

Ainda não. Não dá para projetar um objetivo tão distante como esse. Ainda faltam quatro anos. O nosso próximo objetivo são as Olimpíadas do Rio. O meu sonho é estar no time que vai disputar as Olimpíadas no meu país, na minha cidade, e com a nossa torcida.

Wallace mora com a avó em Mônaco e pretende levar a família toda se for contratado pelo clube (Foto: Claudia Garcia)


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