A medicina no antigo Egito
Publicação: 20 de Outubro de 2013 às 00:00
« jorge boucinhas » médico e professor da UFRN - boucinhas_jc@hotmail.com
A aparição da escrita tirou os historiadores da pura e simples investigação de restos fósseis (os quais são a única base para o conhecimento sobre os tempos pré-históricos) e permitiu um mergulho mais acurado nas formas de pensar do homem sobre a doença e a morte. A existência da comunicação grafada e sua utilização prática possibilitaram o acúmulo de conhecimentos desse tipo através das gerações do Antigo Egito e muita coisa ficou para a posteridade.
Assim, a mais antiga descrição de um infarto do miocárdio fulminante data de uns 30 séculos antes de Cristo e está narrada no sarcófago de um nobre chamado Was Ptah, tombado morto durante uma cerimônia.
Khaui, médico da corte na IVa. Dinastia (uns 26 séculos antes de Cristo), citou a deusa Sekhmet como a protetora dos médicos e deixou claro que os facultativos de então dividiam-se em três grupos: oculistas, dentistas e internistas. Seus escritos deixaram patente que já nessa época os médicos começaram a constituir uma classe distinta da dos sacerdotes e também mostraram que a aristocracia egípcia (ainda não o povo) adotava atitudes objetivas em relação ao adoecer.
Mas, que tal eram os médicos do antigo Egito? Muitos dos conhecimentos anatômicos de então provinham da observação dos animais sacrificados, pois existem várias representações do ato de perscrutar os órgãos internos de animais sacrificados ou de examinar-lhes a pureza do sangue. Ademais, dispunha-se das grandes facilidades investigativas propiciadas pelo costume de embalsamar os mortos.
Nas ruínas da cidade de Kahun, datando de 1900 a.C., encontraram-se fragmentos de papiro com receitas para moléstias femininas. Outro papiro, encontrado junto ao túmulo de Ramsés II, contém mais informações medicinais, e o famoso Papiro de Ebers, documento de 110 colunas, apresentava receitas para numerosas moléstias, preceitos de higiene e até mesmo um breve tratado de fisiologia. Afora eles encontrou-se o de Edwin-Smith, que contém 48 parágrafos com as descrições de numerosos tipos de ferimentos e fraturas, cada um dos quais relacionado à sua respectiva terapêutica.
Talvez em função dos vestígios de teor mágico de que se revestiam certas recomendações, a atividade dos médicos no Egito antigo era bastante prestigiosa. Embora lhes coubessem atribuições distintas das dos magos, ainda dependiam de um quê de misticismo para que seus pacientes lhes dessem maior autoridade. Dentro dessa concepção, cada receita envolvia uma complexa preparação de medicamentos, em que os compostos provinham dos Reinos Mineral, Vegetal e Animal mas eram envolvidas numa roupagem acentuadamente “transcendental”.
Vez por outra a tradução dos textos esbarra com a intransponível dificuldade de serem desconhecidos muitos termos técnicos zoológicos e botânicos da antiga língua egípcia. Verdade que em alguns preceitos a terapêutica é eficaz e racional, como nos casos em que o médico recomendava inalações de vapor para bronquites ou aconselhava dar sementes de papoula aos lactentes nervosos e insones, o que já denotava um saber empírico preciso e útil (ainda recentemente, para lactentes com cólicas intestinais, receitavam medicamentos derivados da papaverina, substância extraída da papoula e dotada de propriedades calmantes e antiespasmódicas).
Num estilo de simplicidade cativante, clareza indiscutível e eficiência bastante razoável, enumeraram-se conselhos sobre como agir sobre ferimentos e fraturas dos mais variados, e a avaliação da própria competência por parte do médico, devendo declarar se defrontava um mal passível de cura através de seus conhecimentos ou confessar sua incapacidade nos casos irremediáveis, aparece repetidamente nos papiros, como que a dar ênfase a um princípio ético a ser observado.
Não obstante as surpresas neles contidas, os documentos que descrevem atividades médicas no antigo Egito também indicam a superficialidade de certos conhecimentos relativos à anatomia e à fisiologia humanas. O vocabulário relativo à anatomia externa era vasto e particularizado e da anatomia interna conheciam-se os ossos e alguns órgãos fundamentais, quais coração, fígado, estômago, pulmões, intestinos e bexiga. Ainda não se distinguiam músculos de nervos, nem artérias de veias, embora soubesse-se já que o sistema vascular centrava-se no coração.
Não obstante a natureza rudimentar dos seus conhecimentos, o médico egípcio esteve junto com o chinês, o indiano e o caldeu nos patamares da construção das práticas de saúde empíricas e merece um preito de gratidão por tal fato. Os grandes edifícios foram levantados pedaço a pedaço!
A aparição da escrita tirou os historiadores da pura e simples investigação de restos fósseis (os quais são a única base para o conhecimento sobre os tempos pré-históricos) e permitiu um mergulho mais acurado nas formas de pensar do homem sobre a doença e a morte. A existência da comunicação grafada e sua utilização prática possibilitaram o acúmulo de conhecimentos desse tipo através das gerações do Antigo Egito e muita coisa ficou para a posteridade.
Assim, a mais antiga descrição de um infarto do miocárdio fulminante data de uns 30 séculos antes de Cristo e está narrada no sarcófago de um nobre chamado Was Ptah, tombado morto durante uma cerimônia.
Khaui, médico da corte na IVa. Dinastia (uns 26 séculos antes de Cristo), citou a deusa Sekhmet como a protetora dos médicos e deixou claro que os facultativos de então dividiam-se em três grupos: oculistas, dentistas e internistas. Seus escritos deixaram patente que já nessa época os médicos começaram a constituir uma classe distinta da dos sacerdotes e também mostraram que a aristocracia egípcia (ainda não o povo) adotava atitudes objetivas em relação ao adoecer.
Mas, que tal eram os médicos do antigo Egito? Muitos dos conhecimentos anatômicos de então provinham da observação dos animais sacrificados, pois existem várias representações do ato de perscrutar os órgãos internos de animais sacrificados ou de examinar-lhes a pureza do sangue. Ademais, dispunha-se das grandes facilidades investigativas propiciadas pelo costume de embalsamar os mortos.
Nas ruínas da cidade de Kahun, datando de 1900 a.C., encontraram-se fragmentos de papiro com receitas para moléstias femininas. Outro papiro, encontrado junto ao túmulo de Ramsés II, contém mais informações medicinais, e o famoso Papiro de Ebers, documento de 110 colunas, apresentava receitas para numerosas moléstias, preceitos de higiene e até mesmo um breve tratado de fisiologia. Afora eles encontrou-se o de Edwin-Smith, que contém 48 parágrafos com as descrições de numerosos tipos de ferimentos e fraturas, cada um dos quais relacionado à sua respectiva terapêutica.
Talvez em função dos vestígios de teor mágico de que se revestiam certas recomendações, a atividade dos médicos no Egito antigo era bastante prestigiosa. Embora lhes coubessem atribuições distintas das dos magos, ainda dependiam de um quê de misticismo para que seus pacientes lhes dessem maior autoridade. Dentro dessa concepção, cada receita envolvia uma complexa preparação de medicamentos, em que os compostos provinham dos Reinos Mineral, Vegetal e Animal mas eram envolvidas numa roupagem acentuadamente “transcendental”.
Vez por outra a tradução dos textos esbarra com a intransponível dificuldade de serem desconhecidos muitos termos técnicos zoológicos e botânicos da antiga língua egípcia. Verdade que em alguns preceitos a terapêutica é eficaz e racional, como nos casos em que o médico recomendava inalações de vapor para bronquites ou aconselhava dar sementes de papoula aos lactentes nervosos e insones, o que já denotava um saber empírico preciso e útil (ainda recentemente, para lactentes com cólicas intestinais, receitavam medicamentos derivados da papaverina, substância extraída da papoula e dotada de propriedades calmantes e antiespasmódicas).
Num estilo de simplicidade cativante, clareza indiscutível e eficiência bastante razoável, enumeraram-se conselhos sobre como agir sobre ferimentos e fraturas dos mais variados, e a avaliação da própria competência por parte do médico, devendo declarar se defrontava um mal passível de cura através de seus conhecimentos ou confessar sua incapacidade nos casos irremediáveis, aparece repetidamente nos papiros, como que a dar ênfase a um princípio ético a ser observado.
Não obstante as surpresas neles contidas, os documentos que descrevem atividades médicas no antigo Egito também indicam a superficialidade de certos conhecimentos relativos à anatomia e à fisiologia humanas. O vocabulário relativo à anatomia externa era vasto e particularizado e da anatomia interna conheciam-se os ossos e alguns órgãos fundamentais, quais coração, fígado, estômago, pulmões, intestinos e bexiga. Ainda não se distinguiam músculos de nervos, nem artérias de veias, embora soubesse-se já que o sistema vascular centrava-se no coração.
Não obstante a natureza rudimentar dos seus conhecimentos, o médico egípcio esteve junto com o chinês, o indiano e o caldeu nos patamares da construção das práticas de saúde empíricas e merece um preito de gratidão por tal fato. Os grandes edifícios foram levantados pedaço a pedaço!
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