De iniciativa do Governo do Estado, o projeto de lei que trata do regime de previdência complementar dos servidores estaduais, enviado para a Assembleia Legislativa em abril, apresenta “vícios formais” e não registrou, até agora, qualquer movimentação no Legislativo. Além disso, o projeto não está acompanhado de cálculo atuarial e estudo de viabilidade, e não foi discutido com os servidores e o conselho previdenciário, como determina lei estadual.
Humberto Sales
Nereu Linhares, do Conselho Previdenciário do RN, levantou uma série de vícios formais no projeto
Nereu Linhares, do Conselho Previdenciário do RN, levantou uma série de vícios formais no projeto
A implantação da previdência complementar é a única forma, prevista em lei, que poderá frear o uso do recursos das aposentadorias e pensões por parte do Executivo. Para os deputados de oposição, o governo só enviou a proposta para cumprir um prazo legal, mas não tem interesse na matéria. O líder da situação explicou que os próprios servidores estaduais pediram para que o projeto não andasse na Casa.
Nereu Linhares, membro do Conselho Previdenciário do Rio Grande do Norte, levantou uma série de vícios formais no caminho que a pretensa previdência complementar percorreu antes de chegar ao parlamento estadual. “Não foi feito um cálculo atuarial, nem um estudo de viabilidade. Também não foi discutido com os servidores e o conselho previdenciário. A lei complementar 308, no artigo 35, determina que toda modificação na política previdenciária do Estado tem que consultar o conselho”, lembrou Nereu Linhares.
Para o deputado Kelps Lima (SD), o governo só tinha uma motivação ao enviar o projeto: “continuar a fazer os saques no Fundo Financeiro (Funfir). A lei que unificou os fundos (previdenciário e financeiro) estabelecia que até o dia 30 de abril o governo tinha que enviar esse projeto”, declarou.
Apesar do aparente desinteresse do Executivo, o parlamentar acredita que a discussão é urgente. “Já cobramos isso umas dez vezes, mas todo mundo fica calado. O Rio Grande do Norte chegou a um momento crucial em que, no máximo, em mais um ano o governo não terá mais dinheiro suficiente para pagar seus servidores nem para investir”, disse, defendendo a ampla discussão da proposta.
Para o deputado José Dias (PSD) a Assembleia acabou por não deixar de forma clara na lei o momento em que os saques no dinheiro dos aposentados estancaria. “Ele [o projeto] não pode ser aprovado a toque de caixa. Mas a grande verdade é que o governo enviou para cá para cumprir tabela”, analisou Dias.
Na opinião do presidente do Conselho Previdenciário do RN, Manoel Duarte, o Executivo estadual tem medo de desequilibrar ainda mais as suas contas. “Como não está havendo sucesso nesse modelo de previdência pelo Brasil afora, o governo não tem tanto interesse assim. Primeiro, porque a adesão a esse modelo não é obrigatório para os novos servidores”, comentou. O conselheiro da Previdência Estadual Nereu Linhares também tem a mesma avaliação.
Um servidor que ganha R$ 10 mil (incluindo boa parte das vantagens), hipoteticamente, só terá direito a R$ 4.663 mil (limite do regime geral de previdência) de aposentadoria caso não queira a previdência complementar. Com a adesão à previdência complementar, todo o dinheiro que ultrapassar esse limite do regime geral deverá ir para esse novo. Portanto, ele poderá se aposentar com os R$ 10 mil desde que pague por isso.
O líder do governo na Assembleia Legislativa, o deputado Fernando Mineiro (PT), informou que o Fórum dos Servidores Estaduais pediu mais discussão sobre o assunto. “O conjunto dos sindicatos foi quem pediu que não se desse sequência ao projeto porque não houve debate. Mas se a oposição quiser, vamos discutir sim”, explicou. “Já propus até a formação de uma comissão especial só para analisar essa questão, mas não foi à frente”.
O Instituto de Previdência do Rio Grande do Norte (Ipern) respondeu às críticas. Conforme a assessoria de imprensa, o projeto de lei foi enviado para a Assembleia sem cálculo atuarial (expectativa média de vida dos servidores, número de dependentes e idade atual) porque esse procedimento só pode ser feito com dados reais após a adesão dos servidores.
Além disso, o instituto informou que uma minoria de funcionários públicos recebe salários acima do teto do regime geral de previdência social. Porém, não especificou quantos seriam. Sobre o estudo de viabilidade da previdência complementar, o Ipern orientou que a equipe de reportagem da TRIBUNA DO NORTE procurasse a Consultoria Geral do Estado (CGE). Entramos em contato com o Consultor Geral, Eduardo Nobre, mas ele disse que não teria como comentar o assunto ontem.
Memória
De dezembro de 2014 até este mês, foram realizados dez saques do governo para completar a folha de pagamento de aposentados e pensionistas do Estado. As retiradas somam R$ 544 milhões. Quando os saques começaram a ser feitos, o Fundo tinha pouco mais de R$ 900 milhões. O Fundo Previdenciário do Rio Grande do Norte foi criado em 2005 com a ideia de pagar a aposentadoria e pensões de servidores e dependentes a partir do ano de 2035. Mas no ano passado, a Assembleia extinguir o fundo ao aprovar a lei complementar 526/2014. Todo o dinheiro foi revertido para o Fundo Financeiro do Rio Grande do Norte (Funfir).
Panorama da lei
PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR
O que propõe o PL que está na Assembleia legislativa
O QUE MUDARÁ:
- Atualmente
22% é a contribuição do Estado para a previdência do servidor
11% é a contribuição do servidor para a sua previdência
Com a previdência complementar:
11% deverá ser a contribuição do servidor
Até 8,5% deverá ser a contribuição do Estado
PRINCIPAIS PONTOS DO PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR DA PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR DO RN
- São tutelados, pelo Regime de Previdência Complementar, os servidores efetivos do Poder Executivo (órgãos e entidade das Administrações Direta e Indireta); dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário; Ministério Público; Tribunal de Contas do Estado e Defensoria Pública;
- A adesão ao Regime, uma vez consumada com a assinatura do correspondente termo, torna-se irrevogável e irretratável;
- Fica vedado ao Estado do Rio Grande do Norte, realizar aporte financeiro em favor da Previdência Complementar, exceto na condição de patrocinador;
- Os servidores públicos efetivos do Estado do RN, cuja investidura no cargo tenha se dado na vigência desta lei, só contribuirão para o Regime Próprio de Previdência Social dos Servidores do Estado do RN até o valor máximo permitido para pagamento das aposentadorias e pensões por morte pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS);
- Os membros do Conselho Deliberativo serão designados para o período certo de quatro anos, com direito a apenas uma recondução, garantida a estabilidade;
- A gestão dos recursos previdenciários da FUPREVIRN será realizada por instituição financeira credenciada pelo Banco Central do Brasil, mediante licitação prévia;
- Incluem-se, na remuneração, para os efeitos desta Lei Complementar, as vantagens excedentes do vencimento básico correspondente ao cargo de provimento efetivo, excetuadas as parcelas indenizatórias e o abono de permanência;
- Fica o Poder Executivo do Estado do Rio Grande do Norte autorizado, em caráter excepcional, a promover aporte de até R$ 1 milhão, que serão compensadas com as contribuições que tiver que realizar, como patrocinador, até 30 dias após o ato da criação da FUPREVIRN, para propiciar a cobertura das despesas administrativas indispensáveis à instalação e ao funcionamento da entidade;
- A FUPREVIRN deverá promover concurso público para ocupação de cargos que vierem a ser criados.
Tribuna do Norte
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