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domingo, 4 de fevereiro de 2018

Ceará faz procedimento pioneiro de construção vaginal com pele de tilápia

Técnica é utilizada em mulheres portadoras da Síndrome de Rokitansky, que torna canal vaginal curto ou ausente.
Pele de tilápia sendo preparada no intraoperatório (Foto: Leonardo Bezerra/Arquivo pessoal)

Procedimento inédito no mundo com a utilização da pele de tilápia é realizado no Ceará para construção do canal vaginal em mulheres portadoras da síndrome de Rokitansky, também conhecida como agenesia vaginal. A síndrome, que acomete uma a cada cinco mil mulheres, provoca alterações no útero e na vagina, tornando o canal vaginal muito curto ou até mesmo ausente.

A técnica, idealizada pelo médico Leonardo Bezerra, professor da Universidade Federal do Ceará (UFC) consiste na construção do canal vaginal usando a pele de tilápia.

"A cirurgia é realizada abrindo um espaço entre a vagina e o ânus e forrando-o com a pele de tilápia. Após o procedimento, é colocado um molde com um formato de vagina, deixando o espaço aberto e impedindo que as paredes da 'nova vagina' se juntem novamente", explica o médico.

Ele explica que, diferentemente do uso da pele da tilápia no tratamento de queimaduras, em que o material ela é colocado como curativo e depois retirada, no caso da agenesia vaginal a pele da tilápia é absorvida e se transforma em tecido.

"A partir desse procedimento, as células dos tecidos da paciente em contato com as células e fatores de crescimento liberados pela pele de tilápia se transformam, como as células-tronco, formando, assim, um tecido com células iguais à de uma vagina real. Finalmente, ocorre a total incorporação e biocompatibilidade da pele de tilápia", explica.

Segundo o idealizador da técnica, o procedimento cirúrgico é minimamente invasivo, recuperação sem complicações e ausência de cicatrizes visíveis, sem risco de rejeição e nem de infecções por vírus.

Além disso, não nascem pelos no interior da vagina criada, diferentemente do que poderia ocorrer com a utilização de pele da virilha no processo de criação da vagina pelo método tradicional.

Vida sexual saudável:
O médico explica ainda que após o período de recuperação a mulher poderá ter uma vida sexual saudável, mesmo sem ter útero, conforme o caso de cada paciente.

"As duas pacientes que passaram pelo procedimento há seis meses ainda não tiveram atividade sexual, mas os exames clínicos mostram que a anatomia e a morfologia das células da nova vagina são iguais a uma cavidade vaginal normal."
Pele em embalagem estéril e, à direita, montada em molde vaginal (Foto: Leonardo Bezerra/Arquivo pessoal)
A cirurgia clássica de reversão da síndrome de Rokitansky, utilizada há mais de 20 anos, reconstrói o canal vaginal com uso de enxertos de pele da virilha da própria paciente. Nesse caso, a mulher também precisa passar pela recuperação de uma incisão.

"É um processo demorado, doloroso e estigmatizante, deixando cicatrizes e risco de pelos incômodos no tecido vaginal reconstruído", explica o médico Leonardo Bezerra.

Duas pacientes passaram pelo procedimento para a correção na Maternidade-Escola Assis Chateaubriand (MEAC), da UFC, em 2017. A cada ano, cerca de cinco procedimentos de correção da síndrome têm sido executados somente na MEAC, pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

Pesquisas:
As pesquisas mostraram que pele da tilápia contém uma grande quantidade de colágeno tipo 1, que a torna tão forte e resistente quanto a pele humana.

Para ser utilizada – tanto no tratamento de queimados, quanto na correção da agenesia vaginal – a pele da tilápia passa por um tratamento especial de limpeza e esterilização, feitas nos laboratórios da UFC.

Para o uso na cirurgia ginecológica, o couro também é retirado e a pele da tilápia se transforma em uma espécie de gel denso, de cor clara, que se incorpora à pele do paciente.

A pesquisa ainda está em caráter clínico-experimental e é executada por uma equipe multidisciplinar da Maternidade Escola Assis Chateaubriand e do Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento de Medicamentos. 
Médicos Zenilda Bruno, Edmar Maciel e Leonardo Bezerra na primeira cirurgia de construção vaginal na Maternidade-Escola (Foto: Leonardo Bezerra/Arquivo pessoal)
O trabalho é acompanhado e desenvolvido com pacientes do Ambulatório de Adolescente da MEAC, coordenado pela médica Zenilda Bruno. A parte experimental da pesquisa e o processamento da pele de tilápia é realizada no Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento de Medicamentos, coordenado pelo professor Manoel Odorico Moraes, da UFC.

Fonte: g1.globo.com

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